C erta manhã flagrei-me atônita, em pé, no certeiro ângulo que me permitia ver a janela de meus aposentos, típico prédio de bairro, de frente para trânsitos, comércios e uma ruela que vez ou outra me dispunha a debruçar-me para observar o pouco movimento. A casa da frente, que há alguns meses havia perdido sua provecta inquilina para uma de nossas recentes gripes pestilentas era agora pintada por um senhor franzino e de baixa estatura. Com certo primor ele lapidava a tinta sobre as paredes, que antes amareladas em bege pêssego e disformes, agora tomavam tom de rubro vivo. Mesmo nesse estado absorto, não demorei a perceber que o interesse não convidava unicamente a mim – prontamente surgiu uma senhorinha com estatura equiparável, de cabelos grisalhos amarrados medianamente em rabo de cavalo, com uma sacola nos antebraços, parecia balbuciar qualquer coisa para o trabalhador enquanto fitava atentamente o vai e vem do rolo entumecido de tinta. Naquele instante percebi que algo nos conectav...
Ensaios de uma alma frenética.